No palco e nos bastidores, jovens do Morro do Andaraí e adjacências são as estrelas da montagem do musical“Forrobodó”, o maior espetáculo teatral de Chiquinha Gonzaga.
Para quem acha que cultura não é direito básico de todos, o projeto Passageiro do Futuro, que atende jovens de 21 comunidades carentes da Zona Norte do Rio através da capacitação técnica em artes cênicas, embarca numa nova história de vida e levou aos palcos cariocas, no mês de outubro, a peça“Forrobodó”, o maior sucesso musical teatral de Chiquinha Gonzaga. Com objetivo de trazer ao público os musicais da época, o espetáculo retratou os costumes da população pobre dos subúrbios do Rio de Janeiro do início do século XX. Entretanto, o enredo apesar de ter mais de cem anos de existência, fala de um universo muito familiar entre os jovens de hoje, ou seja, do “apartheid” entre os pobres e ricos existentes na sociedade. Idealizado no ano 2000 pela atriz e produtora Juliana Teixeira, o itinerante projeto Passageiro do Futuro comemora 10 anos de existência com oficinas técnicas e de interpretação em artes cênicas a jovens de comunidades do Rio, tendo atendido cerca de 800 pessoas nesse período.
Em “Forrobodó”, os jovens atuam em todas as áreas técnicas da montagem, bem como nos palcos. À frente ou atrás das cortinas, são eles que dão vida aos personagens, desenvolvem figurino, cenário e maquiagem; além de cuidar da iluminação e sonorização. “Este é o diferencial do projeto. Aqui, os jovens podem demonstrar talentos em diferentes áreas do teatro. Eles saem com um conhecimento técnico que pode se transformar em profissão e garantir renda. Temos muitos casos de sucesso dentro do projeto”, explica Juliana Teixeira, acrescentando que a peça vai excursionar por oito locais, entre escolas e teatros, sempre com entrada franca. “Faremos apresentações em escolas da rede municipal e estadual, teatros da rede SESC, além do Tijuca Tênis Clube, do Centro de Artes Calouste Gulbenkian e Instituto Benjamin Constant”.
O espetáculo, apresentado durante todo o mês de outubro, teve como destaque a música e a expressão corporal. Toda a trama acontece em torno de dois grandes eventos: um roubo de galinhas e um grande baile. O conteúdo cômico e picante segue a linha do texto original, mas com pitadas contemporâneas. As gírias e palavras erradas que eram características dos subúrbios cariocas da época, foram adaptadas aos tempos atuais. Os jovens participaram, inclusive, da seleção musical utilizada no espetáculo, onde cantam, em alto e bom tom, e dançam ao sabor da ginga brasileira.
O Passageiro do Futuro: 10 anos de arte e cidadania
Há dez anos em atividade, o Passageiro do Futuro é desenvolvido pela produtora Nova Bossa Produções Culturais em comunidades de baixa renda da cidade do Rio, sendo patrocinado pelo Instituto Votorantim há quatro anos consecutivos. Itinerante, já formou turmas em Vila Kennedy, Água Santa, Del Castilho, Engenho de Dentro, Rio das Pedras, Vila Aliança e, retorna para o Andaraí – beneficiando mais de 800 jovens no total. O público-alvo é formado por jovens, de 16 a 21 anos, matriculados na rede pública de ensino. A metodologia une sete oficinas de capacitação em artes cênicas –cenografia, iluminação, sonorização, maquiagem, figurino, interpretação e expressão corporal e vocal – a aulas de reforço escolar, visitas guiadas a teatros e centros culturais, palestras e assistência social. O projeto dura 10 meses e é dividido em oficinas, criação e montagem e circulação do espetáculo. Durante o período de ensaios e de turnê da peça, o grupo é remunerado com uma bolsa salário, relativa às funções de atores, contra-regras, operadores de luz e som, assistentes de cenário, figurino, maquiagem e iluminação. O objetivo é unir cultura e educação para abrir novas frentes de trabalho no mercado de entretenimento e reduzir a evasão escolar, melhorando o rendimento do aluno.
“Nossa meta maior é ampliar as possibilidades de trabalho para estes jovens. Podemos aproveitar a força do mercado de entretenimento do Rio e prepará-los para atuar nos diversos segmentos, seja música, cinema, artes visuais ou moda. Além disso, percebemos um impacto importante na vida da comunidade, pois os estimulamos a aplicar os ensinamentos para melhorar a vida cultural local e na aproximação desses jovens no núcleo familiar”, completa Juliana. Um dos exemplos de sucesso é o estudante Wellington Souza, de 21 anos, que fez parte do grupo do Andaraí, em 2003. Hoje, ele é operador de som profissional e promove bailes e festas em vários pontos da cidade, e em boates de sucesso, como Via Show e Symbol.
Além disso, a iniciativa possibilita a formação de novas plateias sem acesso à cultura. No Brasil, segundo dados da pesquisa de informações básicas municipais, feita pelo IBGE, em 2009, só 9,1% dos municípios têm cinema. E mostram ainda que 92% nunca frenquentaram museus e 93% nunca estiveram numa exposição de arte ou teatro.
Sinopse:
O musical“Forrobodó” estreou em 1911, no Rio de Janeiro, com música de Chiquinha Gonzaga e texto de Carlos Bittencourt e Luiz Peixoto. Apesar do clima de descrédito que a produção sofria antes de estrear, a peça, no entanto, foi sucesso absoluto de público e somou 1.500 apresentações, tornando-se o maior sucesso teatral da compositora. A história aborda os hábitos da população pobre dos subúrbios do Rio Janeiro no início do século XX.